SETEMBRO AMARELO E POSVENÇÃO DO SUICÍDIO
🎗Setembro Amarelo
Setembro Amarelo é uma campanha de prevenção ao suicídio. Foi iniciada no Brasil através da parceria entre o Conselho Federal de Medicina (CFM), a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e o Centro de Valorização da Vida (CVV).
Ocorre no mês de setembro desde 2015 por meio da identificação de locais públicos e privados com a cor amarela e ampla divulgação de informações, tais como epidemiologia, fatores de risco e proteção, locais e formas de tratamento, dentre outras.
Durante todo o mês, profissionais de saúde mental apoiam esta iniciativa mundial, encorajando a população a conhecer o tema e a divulgar/compartilhar a data – 10 de setembro – como o Dia Mundial de Prevenção do Suicídio.
Com informações úteis, pessoas podem identificar sinais de risco de morte em si próprios ou em pessoas próximas e buscar ajuda no local certo.
Mais informações sobre a campanha: http://www.setembroamarelo.org.br
🎗Tema deste ano
Com a proximidade de setembro, comecei a pensar sobre um tema para apoiar a campanha deste ano. Optei por “posvenção do suicídio” por ser um assunto ainda pouco conhecido e, principalmente, por ser necessário.
Desde então, comecei a elaborar um quadro entre suicídio - luto - posvenção - psicoterapia.
Vamos ao texto...
🎗Suicídio e luto
O cenário quanto ao suicídio é alarmante a nível global, causando grande impacto na qualidade de vida das pessoas. Estima-se que seja responsável por mais de 800 mil mortes por ano, correspondendo a um contingente de mais de 2 mil mortes diárias ou uma morte a cada 40 segundos (WHO, 2014).
O Brasil encontra-se no subgrupo de países com elevação dos índices de suicídios, ocupando o oitavo lugar em números absolutos (ABP, 2014).
Se a cada 40 segundos uma pessoa se mata, pode-se concluir que, a cada 40 segundos, também nascem pessoas enlutadas pelo suicídio. De acordo com a ABP (2014, p. 15), “cada suicídio tem um sério impacto na vida de pelo menos outras seis pessoas”.
“A morte talvez finalize o sofrimento de quem se suicidou, mas o sofrimento de quem ficou, o enlutado, é iniciado” (FUKUMITSU et al., 2015, p. 48).
Nos Estados Unidos, pessoas impactadas diretamente pelo suicídio foram chamados de sobreviventes de suicídio. São aqueles que perderam um familiar ou se sentem de alguma forma afetados pela perda.
Aceitar a morte de pessoas queridas é, por si só, processo complexo e dolorido. Luto é o termo que se utiliza para a reação frente à morte de alguém com quem se estabeleceu laços afetivos. Perdas significativas, de forma geral, são consideradas estressoras e o luto pode ser entendido como uma crise existencial, no qual o enlutado precisará de tempo para retornar ao seu estado de equilíbrio (OSMARIN, 2016).
Vários fatores podem influenciar no enfrentamento do luto, tais como a forma como o enlutado lida com estressores em geral, personalidade e história de vida, condição de saúde atual (física e mental), existência ou não de uma rede de apoio (familiar e social), vínculo que tinha com a pessoa que morreu e mudanças que terá de fazer. Além disso, a circunstância da morte é outro fator capaz de facilitar ou complicar o luto, como é o caso do suicídio (SOUSA et al., 2016).
🎗Especificidades do luto pelo suicídio
A morte por suicídio é considerada repentina, violenta, estigmatizada e carregada de emoções e sentimentos contraditórios como a raiva, culpa, frustração e fracasso.
Segundo Fukumitsu e Kovács (2016, p. 5), o suicídio é “um ato humano que provoca sofrimento nas pessoas que ficaram e vivenciaram seu impacto”. Os sobreviventes podem apresentar um luto traumático e complicado, culminando na dificuldade de enfrentamento e prejuízos diversos no seu funcionamento.
Além da dor da perda, os sobreviventes precisarão lidar com outros conflitos inerentes ao suicídio, com a possibilidade de desencadear um sofrimento intenso e de longa duração, precipitando e/ou agravando transtornos mentais, além de ser um importante fator de risco para um novo suicídio (NUNES et al., 2016; SILVA, 2018).
Segundo o Conselho Federal de Psicologia (CFP):
"[...] O impacto de ser sobrevivente é tão significativo que ter se relacionado com alguém que se matou é um dos principais indicadores de risco futuro de suicídio. Ou seja, colegas, amigos e familiares de pessoas que se mataram estão em maior risco do que a maioria das pessoas" (TAVARES, 2013, p. 48).
🎗Posvenção
O termo postvention foi citado pela primeira vez por Edwin Shneidman (pai da suicidologia) no livro On the nature of suicide (1969), que o definiu como “qualquer ato apropriado e de ajuda que aconteça após o suicídio, com o objetivo de auxiliar os sobreviventes a viver mais, com mais produtividade e menos estresse que eles viveriam se não houvesse esse auxílio” (SCAVACINI, 2018, p. 50).
Shneidman relacionou a posvenção com a “prevenção, manejo e intervenções do e para o suicídio”. Para o autor, a posvenção é a “prevenção para futuras gerações” (SCAVACINI, 2018, p. 50).
No Brasil, o termo posvenção foi introduzido em 2011 pela psicóloga Karen Scavacini em sua tese de mestrado e a partir disso, intervenções nesses casos foram aprimoradas no país (SCAVACINI, 2011).
Desde 2013, p. ex., o CVV oferece grupos presenciais de apoio gratuitos e confidenciais aos enlutados – Grupo de Apoio aos Sobreviventes do Suicídio (GASS). Essas reuniões, que acontecem em vários pontos do país, são de apoio aos sobreviventes e podem ser excelentes complementares à assistência profissional (CVV, 2019).
Mai informações sobre os grupos: https://www.cvv.org.br/blog/um-grupo-para-falar-de-suicidio/.
🎗Psicoterapia
Algumas pessoas enfrentam o luto sem a necessidade de ajuda especializada, no entanto, são muitos os que se beneficiam dos atendimentos psiquiátricos e psicoterapêuticos. Portanto, é preciso divulgar a posvenção como ferramenta promissora no cuidado em saúde mental.
No consultório de psicologia, além do luto propriamente dito, o impacto de ser sobrevivente é trabalhado para que o paciente possa ressignificar a sua vida. A atenção é acolhedora, promovendo um espaço para que se possa compartilhar pensamentos e sentimentos (OSMARIN, 2016).
O tratamento é realizado de forma personalizada, a fim de entender quais as reações singulares foram desencadeadas mediante o luto, ou seja, como é para cada pessoa estar sobrevivente, com terapeuta e cliente trabalhando juntos. A partir de então, a culpa, raiva, responsabilização pelo ato suicida, um agravo ou possível risco de suicídio poderão ser elaborados (OSMARIN, 2016).
Até que o luto seja finalizado e a pessoa consiga pensar naquele que faleceu sem dor, algumas tarefas devem ser realizadas. A primeira delas consiste em aceitar a perda e a segunda diz respeito à elaboração da dor. Na sequência, a pessoa precisará ajustar-se ao ambiente vazio e assim reposicionar o ente querido em termos emocionais, de forma que possa reinvestir suas emoções na vida e no viver. Assim, gradativamente, o sofrimento estará sendo substituído pela saudade (OSMARIN, 2016).
REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE PSIQUIATRIA - ABP. Suicídio: informando para prevenir. Associação Brasileira de Psiquiatria, Comissão de Estudos e Prevenção de Suicídio. Brasília: CFM/ABP, 2014.
CENTRO DE VALORIZAÇÃO DA VIDA – CVV. Um Grupo para Falar de Suicídio. Disponível em: https://www.cvv.org.br/blog/um-grupo-para-falar-de-suicidio/.
FUKUMITSU, K. O.; KOVÁCS, M. J. Especificidades sobre Processo de Luto Frente ao Suicídio. Psico (Porto Alegre), Porto Alegre, v. 47, n. 1, pp. 03-12, 2016, p. 5.
FUKUMITSU, K. O. et al. Posvenção: uma nova perspectiva para o suicídio.Revista Brasileira de Psicologia, Salvador, Bahia, v. 2, n. 2, p. 48-60, 2015.
NUNES, F. et al. O Fenômeno do Suicídio entre os Familiares Sobreviventes: Revisão Integrativa. Revista Portuguesa de Enfermagem de Saúde Mental, n. 15, p. 17-22, jun., 2016.
OSMARIN, V. M. Suicídio: o luto dos sobreviventes. Trabalho de conclusão de curso de Formação em Aconselhamento Psicológico para o Luto. Psicologia PT. O Portal dos Psicólogos, p. 01-13, 2016.
SETEMBRO AMARELO. Disponível em: http://www.setembroamarelo.org.br